domingo, 24 de maio de 2015

Bartolomeu Barbudo – Hospital Dom Malan – 23/05/2015




A gente aprende na nossa oficina de palhaço que o nariz, a nossa máscara, é a máscara que menos esconde e a que mais revela. Ao contrário de várias outras máscaras teatrais, que escondem a expressão da artista, o nariz não esconde nada. E eu sempre acreditei nisso durante toda a minha experiência de pouco mais de um ano como palhaço, mas a atuação deste dia me mostrou algo muito diferente, não sei se acredito tanto nesse mote de palhaço e da palhaçoterapia.

Neste dia, eu já estava um pouco frustrado porque não poderia atuar com meu figurino porque estava sujo e não tive tempo de lavar. Tive que usar uma roupa improvisada. Depois de chegar no hospital, vestir o figurino improvisado e preparar a maquiagem, percebemos que havíamos deixado o nariz em casa. Éramos só eu e Lívia, porque as outras meninas estavam doentes. E surgiu o dilema: o que fazer? Como atuar sem nariz? Naquele instante de dúvida, tomamos uma decisão. Vamos atuar sim! Pintamos o nariz de vermelho com um pozinho (não sei o nome dos componentes da maquiagem, rs) e continuamos o ritual como de costume. Subir energia, encontrar o olhar da melhor companheira, ganhar os corredores do hospital. E todo o começo foi muito estranho, muitas perguntas e dúvidas correram pela minha cabeça “Será que vão me reconhecer como palhaço?”, “Será que vou conseguir ser palhaço?”, “Como vou enfrentar isso?”. E foi quando eu percebi que a nossa máscara, o nosso nariz, é uma proteção, é um escudo. Eu me escondia no meu nariz também, o nariz é confortável, o nariz tem a memória de várias outras atuações passadas. Sem o nariz, eu tive medo de perder minha identidade como palhaço.

A energia foi subindo devagarzinho. Os primeiros jogos foram difíceis, um pouco travados, mas a gente continuou. De encontro em encontro, a gente foi se apropriando no nosso espaço, foi sendo cada vez mais clown e fazendo jogos cada vez melhores. Bartolomeu e Jasmin foram nomeados padrinho e madrinha de uma boneca, e pra tomar conta direitinho da afilhada, Bartolomeu a pegou nos braços e se pôs a ensiná-la a pedir a benção para todas as tias e tios do quarto. Três meninas deste quarto nos acompanharam a atuação inteira, e elas foram fundamentais pra manter nossa energia lá em cima.

Nesta atuação, entramos no quarto do Saci-Pererê, onde só podia entrar e ficar lá numa perna só, e a dona do quarto, uma menininha que estava no colo da mãe, demonstrou toda sua autoridade e não deixou a gente pôr os dois pés no chão, apesar dos nossos pedidos. Bartolomeu pediu Jasmin em casamento e amarrou a gravata no dedo de Jasmin como anel de compromisso. Conhecemos várias pessoas legais e tivemos ótimos encontros pelos vários corredores.
E nisso tudo veio reconhecimento: nos olhares das pessoas, nas repetidas vezes que as crianças nos chamavam de palhaço. Vi que não é o nariz que nos faz palhaço, não é o figurino que nos faz palhaço. É o nosso olhar que nos faz palhaço. É a nossa energia, a nossa disposição que nos faz palhaço. O mais importante carregamos dentro da gente o tempo inteiro.  

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