sexta-feira, 21 de março de 2014

Lilica Aranha Céu - Despedida da UPI - 13/03/2014





A UPI é um projeto fantástico. É tão fantástico que perde o status de projeto e ganha o caráter de família para seus integrantes. É incrível o seu poder de transformação sobre nossas vidas.

Fazer o simples não devia ser tão difícil, mas os caminhos que trilhamos na vida, as escolhas que fazemos nela nos distanciam da simplicidade. Em geral, sentimentos como medo, insegurança, solidão, covardia nos levam a construir, ao longo dos anos, "escudos de proteção" contra o sofrimento. Pra não sofrer, abrimos mão de tanta coisa na vida; criamos uma segura zona de conforto onde deixamos de ser cachorros e nos tornamos gatos, onde não precisamos arriscar tanto, nem nos mostrar tanto e, por isso mesmo, também não valorizamos tanto o outro. Na relação com esse outro, muitas vezes perdemos a dimensão do cuidado e nem percebemos. Magoamos, somos magoados e nos trancamos. Mas como cuidar do outro se não conseguimos cuidar bem de nós mesmos? Nesse sentido, são poucas as relações verdadeiras que realmente construímos. Nessas, nos doamos sem esperar nada em troca, aceitamos as imperfeições e os erros do outro e conseguimos perdoarporque compreendemos o humano que ele é e porque temos clareza do humano imperfeito que somos. No contexto das zonas de conforto e escudos de proteção, esse tipo de relação é muito difícil de ser estabelecida e, de uma forma ou de outra, sofremos.



Por isso, a UPI é tão significativa nas nossas vidas. Porque ela nos desafia a mergulhar em nós mesmos, a enfrentar nossos monstros e a desconstruir a zona de conforto e os escudos de proteção, nos mostrando a importância do outro e a necessidade de resignificar nossas relações e a vida, em última instância. Isso é lindo e emocionante.

Reconheço o valor que a UPI tem na minha vida e sou muito (muito, muito) grata por tudo que vivi e eaprendi. Desejo, com todo meu amor, que a UPI consiga crescer sem perder sua essencia. Que continue ensinando aos que por ela passam o verdadeiro valor do olhar e escutar; do eu, mas também do outro; da entrega e do encontro; do cuidado e acolhida; do aceitar o erro e saber perdoar; do respeito e amizade. Tudo isso em relação a si e em relação ao outro, incluindo aí os que já estão na UPI, os que estão chegando agora, os que estão deixando, os que já passaram e os que não vão passar pela UPI. Isso é um enorme desafio e uma grande responsabilidade.

E justamente por me sentir responsável é que pontuo a necessidade de se avaliar o processo de seleção e de iniciação dos novos clowns, considerando que ele é fruto de um processo novo e que o novo por vezezs gera medo, resistência e conflitos. Acredito que uma avaliação com amor, justiça e respeito é necessária e vai fazer o grupo crescer ainda mais.

Fiquei feliz por ter conseguido participar da seleção e de parte da oficina de iniciação dos novatos. Uma pena não ter acompanhado todo o processo. Eu fiz o que tava podendo fazer. Me emocionei muuuuuito no último dia de formação, especialmente no alerramp porque fui pra ele consciente de que seria meu último alerramp.

Questões relacionadas a tempo/compromisso/entrega já sinalizavam meu afastamento mais cedo ou mais tarde. Então, ao final da oficina, antes do alerramp, conclui que, pro meu coração, aquele seria o melhor momento pra fazer isso, porque eu guardaria as emoções e a beleza daquele dia, do nascimento dos novos clowns, de forma mais significativa na minha vida. A dor do parto é grande, mas eu resolvi comprar o risco e vou partir da UPI com o final desse semestre. Tô triste, mas também feliz por tudo que vivi e aprendi na UPI, pelas pessoas lindas que conheci, pela família que me acolheu, pelo carinho e amor que sei que não se perdem quando são verdadeiros. 

Obrigada UPI, por tudo.



Mira Tavares e Lilica Aranha Céu.

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