domingo, 16 de março de 2014

Esperança Sambacanção - Abraço Grátis - 15.03.14



            A sala do núcleo temático, a qual passamos os vários dias de formação/gestação, pra mim sempre foi um o útero materno. Com o fim da oficina, eu tive a sensação de que já havia nascido, quando me vestiram pela primeira vez, quando desenharam o meu novo rosto com tintas e lápis de pintar, quando ganhei um nome todo meu e fui batizado com ele, pronto, pra mim o nascimento já havia se concretizado. Mas esqueci de uma coisa importante, das primeiras palmadas que a gente leva quando ainda nem sabe o que ta fazendo no mundo... O “dotô” segura a gente e de cabeça pra baixo e  dá uns tapinhas no bumbum, são umas palmadas de realidade querendo dizer: “Ei, acorda, hora de enfrentar o mundo!”  Hoje nasci, senti o frio da sala de cirurgia, coloquei o pé na rua. Me atrevi, dei a cara a tapa, e receber aquelas palmadas de realidade foi inevitável...
            Vesti a roupa de Esperança logo cedo quando meus companheiros nem aviam chegado, fui sentar no corredor pra desenhar Esperança na cara, ele tem traços que são só dele. Achei que seria mais difícil, já havia sonhado com a maquiagem e tinha sido um desastre, hoje foi tranquilo, quando vi Esperança já estava a postos, quase pronto pra abraçar.
              Na sala pequena apertada e enérgica, subimos nossos narizes,  a rua nos esperava, o mundo estava lá, nas esquinas, nos carros, nas janelas, meu Deus, tinha chegado a hora, a hora de dizer sim, a hora de pular no vazio.
             A rua me acolheu de um jeito diferente, me senti em casa, até porque a casa do clowm é o mundo, ele pode tudo, e ali era a minha casa; as ruas de Juazeiro nunca estiveram tão lindas, uma colorição só, as janelas tinham mais vidas naquela manha, as buzinas eram melodias, não queriam que nós andássemos mais depressa, não estavam apressadas, pelo contrário, pareciam nos chamar pra dentro dos carros, os sorrisos eram sinceros e os olhos eram cansados, olhos de quem tinha um longo dia de trabalho pela frente, uns haviam acordado cedo pra trabalhar, já a gente estava ali pra brincar, era diversão,  já dizia Lorena Chaves, “Todos são crianças, sem medo e sem lembrança...”
           O camelódromo ficou pequeno pra tanto nariz vermelho, faltou-me espaço, era tanta gente querendo abraçar, era tanta gente querendo distribuir amor que as vezes me vi perdido, sem saber pra onde correr, sem saber que jogo usar pra caber tanto companheiro, mas fui jogando, fui dizendo sim do jeito que pude.
            Em meio as atuações, me encontrei muito fácil nos jogos de Santiago Suado e Pietra Fofolete, a energia deles estava batendo muito e o desenrolar das histórias aconteciam muito fácil. Tentei conhecer os jogos dos meus outros companheiros, e saber como as coisas andavam em meio ao camelódromo, tinha um medo danado de ficar sozinho, é que é sempre bom ocupar nossos espaços vazios e vocês bem sabem.
          Tive a sorte de ter apenas um encontro ruim, onde a energia das pessoas era pesada, e de gratuito eles só tinham grosseria, tentei dá o troco com um abraço mas mesmo assim não funcionou muito, continuei minha caminhada, e dei de ombros.
             Descobri que Esperança é um pouco baiano, e um pouco namorador, chora por nada, faz charminho e inventa uma desculpa fácil pra sair de fininho, sorrio, arrochou, fez de tudo um pouco, levou muitos olhares, mas poucos encontros, isso mesmo poucos encontros, porque em meio a tanta novidade, não conseguiu ter molejo pra segurar os jogos o suficiente para encher a jarra, encontrou muita gente, e ao mesmo tempo não encontrou ninguém.
           Mas é uma coisa de cada vez, antes do encontro existe sempre um olhar, e olhares ele  encontrou, muitos, de todos os tipos, não teve tempo pra ficar, mas sei que deixou o melhor que pôde.
Gledson espera ter pintado de verde o dia de cada um que tocou com abraço ou com meu olhar de Esperança, e Esperança por sua vez, vai dormir mais tranquilo hoje, com o sentimento de que o dever foi cumprido como pôde.
               A sensação de que a estrada apenas começou está aqui comigo, e pra o núcleo do dia, escolhi “Andajá” (aquele brinquedo de criança, que ela usa quando tá começando a dar os primeiros passos...)  



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