segunda-feira, 21 de março de 2016

Bartolomeu Barbudo – Hospital Dom Malan – 18/03/2016



Esta atuação começou devagarzinho, com o capitão Bartolomeu Barbudo e a papagaia Cassandra Paçoca tentando domar esse navio tão complicado que é o Navio Dom Malan. Deixamos nossos tesouros no cofre da Sala das Bolsas, com uma guardiã muito segura do seu trabalho, e começamos a andar pelo hospital.

Desta vez, não demos preferência a nenhum setor. Estávamos exploradores, inquietos, desbravadores. Fomos convidados primeiro para visitar o setor das mulheres que haviam acabado de ter filhos, e os cabelos cacheados de Bartolomeu fizeram sucesso! Mostrou como usa esses cachinhos tão lindos para paquerar, como fica brincando com os cachos tão sutilmente.

Fomos também para o setor onde as mulheres ainda estavam grávidas, e conhecemos como elas decidem o nome que vão dar às suas crianças.

Em seguida, passamos pela pediatria, onde tivemos o encontro mais sensacional, mais incrível, mais supimpa, mais bacanudo, mais emocionante da tarde. Uma menina sensacional, com cerca de 12 anos de idade, que estava internada e tinha dificuldades para falar e só conseguia nos enxergar quando seus pais levantavam suas pálpebras. Que menina pra vibrar de energia! Que menina com tanta alegria dentro dela, com tanta emoção e carinho! Nos apresentamos, conversamos bastante e ela nos pediu para dar um apelido a ela. Cassandra, muito esperta, fez 3 perguntas muito boas pra ajudar nessa tarefa: qual princesa você mais gosta? Cinderela. Qual fruta você mais gosta? Melancia. O que você quer ser quando crescer? Professora. E assim chegamos ao apelido: Prof Cid Lancia. E foi ela, essa menina sensacional, a Prof Cid Lancia que encheu meu coração de carinho. Ela nos pediu o nosso telefone, e a vontade foi tão grande de manter contato com ela, que sim, demos o nosso telefone para falar com ela em outro momento.

Em 2 anos de palhaçoterapia, mesmo com pacientes que encontramos mais de uma vez porque sua internação foi longa, nunca aconteceu de estabelecer um vínculo dessa forma. Achei bem marcante esse momento. Espero que eu receba o contato e que ela possa ver o estudante de saúde que existe por trás do nariz vermelho, o estudante de saúde que se importa com as pessoas que encontra no hospital.

Ainda na nossa andança hospital adentro, conhecemos finalmente um setor pelo qual só víamos a janela fumê por fora, um setor que sempre foi uma incógnita nas nossas atuações, que nem sabíamos o que tinha lá. Era o setor que resolvia as internações, e lá conhecemos pessoas muito agradáveis. Vimos que existe vida e alegria para além da janela escura, e foi muito divertido olhar as pessoas pelo outro lado da janela.

Por fim, acabamos em um jogo tenso. A Sala das Bolsas, onde guardamos nossos tesouros, nossas chaves, nossas coisas, fechou mais cedo e bateu aquele nervoso: como vamos voltar pra casa? Será que vamos ter que dar plantão de palhaço a noite inteira no Dom Malan e partir para as nossas terras, nossas casas só no dia seguinte? Mistério, dúvida, inquietação. Foram vários minutos de ansiedade, sem saber se iríamos conseguir recuperar nossas coisas. E isso tudo no meio da atuação, sem poder deixar a energia cair, sem poder perder a postura palhaçal, rindo das nossas próprias desventuras. Contamos com a ajuda de profissionais excelentes do hospital, que depois de algum tempo conseguiram pegar nossos objetos, mas para mim esse nem foi o maior desafio do final da atuação.

O maior desafio foi o encontro com um homem que queria discutir política com um palhaço. Que queria se impor sobre o palhaço. Normalmente, isso não me incomodaria, porque eu acho que na vida de palhaço é bom a gente colocar a outra pessoa sempre pra cima, empoderar o paciente, o acompanhante, e fazer do ofício do palhaço uma escada para isso, um caminho para isso. Só que esse homem teve um discurso que achei forte, que achei ofensivo. Seu discurso era que todas as pessoas eram corruptas, que todo mundo tinha seu preço, que ninguém era honesto, e quem permanecia honesto ou era porque não tinham oferecido seu preço ainda ou ia pra debaixo da terra. Sim, exatamente, fez até questão de gesticular esse último ponto. Tentei argumentar na paz enquanto pude, e manter cordialidade, mas teve momento que senti que eu iria começar a puxar pontos mais sérios e não era algo que eu estava disposto a fazer como palhaço. Senti vontade de ignorar essa pessoa. Mas senti também que estava sendo provocado, senti também que aquela pessoa queria irritar o palhaço, queria fazer o palhaço perder a pose, e eu percebi esse desafio e não ia dar esse gostinho não. Mantive o bom humor o tempo inteiro e não cedi às provocações, e eventualmente a única solução foi ignorar e mudar o foco da cena pra outras pessoas. Com a ajuda da minha melhor companheira, isso deu certo e fiquei muito feliz com o desenrolar da cena.

Pegamos nossas coisas, saímos e fim.

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