1º Andar (Clínica Ortopédica) com Tunica Caqui, Mametuba de La Rossi e Formiga Espiroqueta.
Navegar por mares nunca antes navegados é sempre uma experiência com frio na barriga, mesmo para Tunica, Mametuba e . Embarcamos em uma aventura que se iniciou ao abrirmos a porta e encontrarmos com um rapaz que nos ‘liberou’ a passagem para a área desconhecida. De cara encontramos um moço e uma garota, mas a mesma não curtiu nossa alegria, estavam descendo pra comer algo, acho que era o monstro da fome que a dominava!! No penúltimo quarto da atuação encontramos com ela novamente e ela já se lançou dentro do jogo!
Jogamos muito. De início, a atacante praticamente artilheira do time era a Formiga Espiroqueta. Ela estava mais liberta, mas aos poucos vendo a interação fui também me desprendendo, acho que ajudou muito termos encontrado uma criança no primeiro quarto em que entramos. Tímido, se escondia, mas ao mesmo tempo era perceptível no olhar que ele queria brincar. Entrou no jogo também a sua mãe, e como não recebíamos estímulo deles, a Formiga lançou a idéia de que aquele dia era especial, e estávamos imbuídos do poder de conceder um desejo pra cada pessoa. Só não valia qualquer coisa e dinheiro, porque esse tava em falta no mercado! Um dos pacientes do quarto, pediu que lhe trouxéssemos a sua namorada que mora longe, e nos apresentou uma foto dela, a qual pegamos, circulamos e adentramos o quarto em busca do seu leito novamente. O sorriso dele foi contagiante e assim ainda realizamos mais um pedido seu, que era caminhar pela enfermaria com aquela primeira criança, que era seu amigão do hospital e como ele estava de preto, lembrei do MIB homens de preto e começamos a circular cheio de pose no quarto. Sobre os desejos, ainda dançamos, os presenteamos com nossa cantoria porque não tinha música e entregamos a um sábio idoso uma casa no seu leito.
O rapaz que nos pediu a presença da sua namorada tinha pinos nas pernas, e seus pinos era dourados com preto e pareciam um braço de guitarra. Na hora eu Tunica Rock’n Roll queria desabrochar, mas o jogo do momento ainda tinha um lindo potencial de crescimento. Deixei-a dando um gás internamente com a empolgação.
O outro quarto que entramos tinha um senhor comendo que não queria ser atrapalhado e um outro que era muito desconfiado, mas que ainda recebeu como concessão do seu pedido um carro, nada resistente, feito de Mametuba, Formiga e Tunica, mas um modelo lindo! :D O jogo não perdurou muito lá e seguimos para a outra porta, e lá estava uma senhora sentada com os olhos nos dizendo ‘boas-vindas’. Ela e sua companhia estavam ouvindo forró ao celular, e o seu pedido a nós foi também uma canção, mas o repertório mudou e dançamos e cantamos ao ritmo de uma música gospel. Eu não sabia cantar nada, não conhecia a letra, mas naquele momento, o mais importante era tentar realizar o pedido. Em um outro leito um rapaz também solicitou uma música gospel e como eu não sabia nenhuma, incorporei a apresentadora do show das cantoras.
A Dona R. foi uma surpresa marcante no dia. Quando chegamos no seu quarto e interagíamos com a outra paciente, ela estava deitada, repousando com os olhos fechados, e depois começou a querer se levantar, mas não conseguia sozinha. Nessa hora nos pediu ajuda, mas não tínhamos conhecimento de sua mobilidade, então, não podíamos mexê-la como ela queria. Bia chamou uma das enfermeiras que chegou e arrumou o decúbito preferido, e a D. R., acordada começou a interagir conosco. Sua blusa e seu lenço eram floridos, e começamos a dizer que refletia a sua alegria, que ela tinha um excelente bom gosto e que ela seria a partir de então nossa consultora de moda para melhorar nosso figurino. Ela nos disse que nada precisava ser mudado, estava tudo lindo, que a gente não esquecesse o nome dela e que retornássemos mais vezes, que ela era uma pessoa alegre, mas que o hospital e essa coisa ruim que ela estava passando estavam a deixando calada, triste. Foi então que falamos que o nome dela* combinava com a sua roupa e com vibração, alegria, que não iríamos esquecê-la e que ela tinha direito a um pedido, o qual foi para tirar tudo de ruim que ela estava sentindo. Recebemos dela o ‘combo’ de coisas ruins e pensamos em jogar pela janela, mas poderia acertar alguém, então jogamos no lixo e concluímos mais uma das solicitações!
Andando pelo corredor vimos uma moça sentada à porta de uma das enfermarias sobre uma escadinha. Parecia uma modelo fotográfica em ação. E como já estávamos no clima da moda após as dicas de D. R., incorporamos as modelos na passarela (corredor) e descobrimos que a única forma de entrar para o quarto que a moça vigiava era sendo também uma modelo e assim desfilamos com umas senhoras no quarto, recebemos mais dicas de beleza, troquei meu lenço rosa com a Espiroqueta e tivemos um momento ímpar: houve uma senhora que deitada sobre o seu leito começou a chorar quando dissemos que ela poderia pedir o que almejasse e um lindo momento ocorreu: ela segurou a mão de Mametuba e trocaram olhares sinceros por um bom tempo. Esse foi um dos quartos mais emocionantes. Tive dificuldade de não sair do clown quando vi uma paciente que semanas atrás havia dado entrada no hospital em intensa dispnéia por derrame pleural caminhar de um lado a outro da sala desfilando conosco e dando gargalhadas.
O próximo quarto que entramos foi um indicado por um homem que passava pelo corredor e começamos a desfilar juntos. Perguntamos de onde é que um modelo tão bem treinado estava vindo, que precisávamos encontrar esse lugar. Na enfermaria, encontramos um senhor que ria sem parar com a nossa presença e fazia sinal de ‘legal’ e falava: “aí, amizade!!”, que virou nosso cumprimento aos demais pacientes. Um dos acompanhantes estava repousando sobre uma cadeira meio alongada, que me recordou um daqueles equipamentos de academia que se usa para fazer abdominal. Como percebi a receptividade dele, lancei o jogo de que eles ali se preparavam o corpo pro desfile na passarela, que ele fazia muito bem ao trabalhar o abdome para ficar tanquinho! Ele comprou o jogo e disse que quem quisesse poderia também malhar a ‘barriguinha’.
O último quarto que adentramos vimos as pessoas conversando e entramos na conversa: o assunto era dormir. Uma das pacientes tinha a mania de dormir sobre a mãe e queria essa posição para dormir. Uma senhora preferia dormir de ladinho e um dosacompanhantes, vendo que estávamos juntando uma posição a outra para criar uma nova posição para acabar com nossa insônia, nos disse que preferia de bruços, de forma que juntando as posições indicadas iríamos sair rolando pela cama. Gostei muito disso, ele comprou o jogo e surpreendeu!
Ao fim, fomos ao final do corredor onde um menino e seu pai observavam a janela do corredor. Ele disse que gostava da vista, perguntamos se dava para ver a casa dele, e ele disse que não, por que morava no José e Maria (bairro petrolinense). O seu pai perguntou se conhecíamos e eu com muita destreza confirmei que sim, e que aliás, adorava José e Maria, sabia a história inteira, me lembrava do pé de feijão e perguntei se lá eles tinham muito feijão pra fazer uma feijoada bacana! Eles riram e eu senti aquilo como um dos meus melhores presentes do dia, eu que, de início me senti meio travada, que amarguei com a garota que não curtiu nossa intervenção, ter respondido aquela resposta criativa sem nem ter percebido que seria tão boa assim!
Depois de um tempo lá interagindo, nosso tempo chegava ao fim, com ares de missão cumprida, e melhor que uma despedida, ouvimos no corredor: vão nos outros andares também, tem gente lá que espera por vocês! Fazer o bem sem ver a quem!
“Pouco importa o julgamento dos outros. Os seres são tão contraditórios que é impossível atender às suas demandas, satisfazê-los. Tenha em mente simplesmente ser autêntico e verdadeiro” (Dalai Lama)
Jeanne Aiko de Souza Nakagawa, Tunica Caqui.